Trans…
piro,
trans… muto,
trans…mito,
trans…porto,
trans…ito,
trans…paso.
Así
juega mi jugar.
Susy Shock
Trans. Um projeto multidisciplinar que
envolve dança, teatro e performance; co-criado e interpretado por Ana Luisa
Santos e Guilherme Morais e dirigido por ele mesmo. Transnacional, porque em
2014 saiu fora do Brasil para se apresentar nas cidades Argentinas de Córdoba e
Buenos Aires. Transespacial, porque já nasceu em vários cenários de Belo
Horizonte como também da periferia da cidade. Transportador, porque te leva
viajar sem sair da realidade, pois o considero um belo exercício de auto
questionamento aonde a partir da realidade em que vivemos se faz um
levantamento sobre outras-novas possibilidades de habitarmos o mundo. E
Transgessor, felizmente, porque vai além de toda estrutura, de todo “ 2 + 2 =
4”, vai além da maneira como o
capitalismo nos codifica e controla nossos corpos-mente-espírito.
Foi para mim, um enorme prazer ter
acompanhado de perto o processo de construção do trabalho, além de ter sido
espectadora várias vezes. Projeto
híbrido, de pensamento não hierarquizado, que transmuta, transcende e reinventa
seus múltiplos gêneros performativamente. Uma pesquisa “degenerada” pela
ausência de gêneros estabelecidos socialmente, que naquela não-construção abre
janelas para infinitos começos e possibilidades. Eles (Ana Luisa e Guilherme),
na sua transformação corporal e através
de suas ações, questionam os papéis impostos, feminino e masculino, e a
correspondência “obvia” instaurada na nossa sociedade: feminino = mulher e
masculino = homem. Os performers-criadores transitam durante todo o tempo que
dura o espetáculo por várias presenças que ficam no lugar do “entre”, não
chegam a ser personagens, nunca se descolam de seus próprios nomes em cena e
carregam sua bagagem corporal, sua memória incorporada, e isso é para mim (como
espectadora) o que atravessa o limiar arte-vida e nos deixa muitas perguntas em
aberto. Nós, entramos na troca, no jogo e comungamos com a ideia de sermos “o
outro”.
Há um jogo de duplos onde se tenta
romper justamente os binarismos de “noivo/noiva”, “Adão e Eva”, “bem/mal”, para
citar alguns exemplos reais. Duas noivas vestidas de branco, (Ana e Guilherme)
que ao mesmo tempo se vêem um pouco masculinas e realmente não se sabe que é
quem... “A gente brinca muito com isso, quem é que carrega a noiva? Alguém tem
que carregar a noiva! Por que? Porque ela é fraca? Então vai carregar e vai
soltar, vai machucar…” (diz Ana Luisa numa entrevista feita por mim em 2013).
Trans convida, a quem estiver disposto,
a participar do ritual, do renascimento, da reconstrução, a correr o risco de
procurarmos nosso próprio “ser monstro” essencial, híbrido, belo e de corpo
expandido, sem fronteira. Fugir das fronteiras do nosso próprio território; o corpo. Fugir dos clichés
ou padrões de beleza que nos vende o mercado: mulher tem que depilar, homem
tem que ser forte e sarado, mulher sempre bem maquiada e melhor de cabelo
comprido, homem pode andar de peito para fora, mulher já não pode, homem não
pode dançar, mulher não pode sentar de perna aberta, mulher não fala de sexo em
público, homem sim porque é homem... e assim.
No Trans nada é e tudo é. É um ritual
artístico urbano de metamorfose do corpo. Ao fazer uso da dança contemporânea e
do teatro as ações performáticas do Trans potencializam a sensação de um “corpo outro” que não é
só de mulher, de homem ou gay, não está nesse lugar, mas além. Dialogam e
encaram as dificuldades apresentando os problemas de viver numa cultura
conservadora, religiosa e bastante hipócrita. É um convite a reinventar os códigos, a sujar em
vez de limpar, é como diz a filosofa
Beatriz Preciado “la invención de nuevas prácticas de subjetivación”.
FOTOGRAFIA por Tiago Macedo
Sobre Sandra Bonomini: