As verdadeiras trepadeiras de plástico





TREPADEIRAS DE PLÁSTICO surgiu da observação de um tipo de material  muito comum em lojas de R$ 1,99 e também em lojas especializadas. Uma enorme variedade de plantas, flores e trepadeiras de plástico estão disponíveis a preços baixos ou não, dependendo da quantidade e do produto, claro. Sempre fiquei impressionada com a diversidade e a beleza paradoxal desses vegetais não-orgânicos. Nesses locais, onde há abundância de pétalas, caules e folhas artificiais, o conjunto do excesso de espécies era tão estranho quanto interessante como metáfora do mundo contemporâneo: muitas cores vibrantes, algumas texturas estranhas, insetos domesticados, ferormônios artificiais e muita, muita exuberância falsa.




Soma-se a essa fascinação contraditória por um tipo de material tão ordinário quanto acessível, a pesquisa que tenho desenvolvido nos últimos anos sobre as referências históricas, imagéticas e mitológicas da figura da mulher “cornucópia” (do latim cornu copia, corno da abundância de cornu, -us, corno, chifre + copia, -ae, abundância, riqueza ou vaso em forma de corno que se representa cheio de frutos e flores e que é símbolo da agricultura e do comércio). Essa imagem de um tipo de fêmea meio fauna meio flora, muito Carmem Miranda depois, foi que marcou o imaginário europeu conquistador sobre o Brasil, e especialmente, sobre a índia brasileira. Esse ser de volúpia, que atrai tanto quanto amedronta, representa um caminho de reflexão sobre essa relação histórica entre o corpo da mulher e o corpo da terra brasileira, no sentido de seu “descobrimento" pelos portugueses em 1500. Relação de dominação tanto da terra, como do corpo. Como no éden, não há regras, não há limites: é só pegar. 




Essa herança histórica - que não é só minha nem só do Brasil, vide outros países da América Latina - é de arrepiar ao imaginarmos essa violência como fundadora de uma mistura ou de uma das misturas cujo fruto é o meu país de origem e a cultura machista que se processa até então. Por isso, a saída é buscar uma referência antropológica mais antiga, quiçá anterior a esse fato histórico - nos povos que viviam aqui antes da colonização ou muito depois, agora, a todo momento, para transmutar, também através da performance, essa configuração das relações de gênero, de meio ambiente e de alteridade.





No hoje, a idéia de um éden contemporâneo - além de atualizar o mito religioso de Adão e Eva - parece-me pertinente para refletir sobre as relações afetivas atuais. Em TREPADEIRAS DE PLÁSTICO, um falso paraíso de plantas  recebe não um casal de homem e mulher, mas um corpo que é vivo e outro corpo que é plástico. Uma mistura de ninfa e fauno e uma boneca inflável. A ação que ocorre na instalação está baseada na relação estabelecida ou não entre essas figuras. Há pelo lado do fauno-ninfa uma tentativa tanto ingênua quanto blasé de seduzir ou pelo menos agradar a boneca, que, por sua vez, não reage aos estímulos visuais, sonoros ou olfativos que o outro corpo lhe propõe. Uma mistura entre um olhar de descoberta e pureza que a ninfa joga com o espaço e com as pessoas que testemunham a ação confunde-se com outras atitudes mais maliciosas, próprias do fauno, que culminam com um tipo de coito artificial entre elxs. Se há gozo? Essa é a grande questão. 



Nesta semana que marca a metade da jornada INFLAMÁVEL, começamos com a performance ZONA DE CONFORTO, no dia 28/01, na escadaria em frente à Galeria do BDMG Cultural. Na sexta, dia 30/01, é a vez de RALO. E no domingo, dia 01/02, realizo PÉGASUS. As ações acontecem sempre às 15h e todos estão convidados.


FOTOGRAFIA por Fernanda Branco Polse