Nesta sexta-feira, 30 de janeiro, já estamos cada vez mais perto do carnaval. E em Belo Horizonte, onde acontece a exposição INFLAMÁVEL, assim como em vários lugares do Brasil onde a festa oficial não foi suspensa por falta d’água, a programação de blocos já está alinhada. Eu também fiquei alinhada na Galeria do BDMG Cultural, onde realizei RALO, performance de caráter instalacional e escultórico a partir das 15h. Por quatro ventosas, ligadas a fios conectados às paredes de frente e fundo da galeria, meu corpo permaneceu suspenso. Enquanto dura a pressão dos desentupidores de pia que utilizo na ação, permaneço ali. Consigo fazer poucos movimentos, porque os fios tesos, assim como o arco da promessa, me impelem a ficar em um mesmo espaço, o centro da galeria.
Questiono muito essa dependência da arte com relação ao espaço expositivo e a outros lugares institucionais, especialmente no caso da performance, uma linguagem tão aberta, tão indisciplinada, tão imprevisível. Esses lugares, assim como a artista, a ação e aqueles que a testemunham, são perfurados pela fricção de experiência do trabalho performático que acontece naquele espaço, de acordo com relações propostas por suas paredes, com seus limites, ou por suas portas e janelas, como possibilidades de expansão. Há uma troca, tomara um diálogo e, geralmente, alguma coisa transborda, do corpo ou do espaço. A galeria é um lugar tão interessante e tão complicado como qualquer outro espaço público ou privado, seja um teatro, uma casa compartilhada, um bar, um supermercado, um restaurante, um cemitério, um cartório e outros tantos sítios em suas várias repartições, expectativas e códigos de uso, de valores, de ritmo, de agonia ou prazer.
RALO traz também essa imagem do corpo sugado. Esse corpo filtro de linha, que contém ou não, os piques de energia. Todo tipo de experiência humana, cibernética, orgânica ou surreal atravessa o corpo. Às vezes acontece tanto acúmulo, de descargas ou outros tipos de radiação, que só mesmo buscando técnicas performáticas de desbloqueio ou recarga. É preciso abrir o aparelho (inclusive o digestivo) e pedir uma nova senha para o sistema, para todos os sistemas, sejam os circulatórios, os nervosos ou os bancários. E assim, desentupir os poros e orifícios por onde tudo passou, por onde tudo passa, dentro ou fora do corpo, sempre no espaço.
Sinto a pressão das ventosas nas costas, no peito, no olhar do público que testemunha a instalação. Estou de pé e os fios ligam meu corpo de forma tensa com espaços opostos. Linhas cortam o ar, dividem mais uma vez a galeria. De um lado o público, de outro uma porta. No entre, eu e meu corpo ali, na pressão. O corpo conduz energia, expando meus meridianos pela galeria. Invisto nessa relação INFLAMÁVEL. Dependo também desse lugar, dessa arquitetura como espaço de atuação performática. Ele me consome, mas também me atualiza. Percebo novas aberturas de sensação, superação e de imagem. O espaço me submete, mas eu também o submeto, na medida em que invento outras presenças, outros pontos de vista sobre o lugar do corpo em qualquer lugar.
FOTOGRAFIA por Fernanda Branco Polse